O
arquivista era um sujeito austero. Conhecedor profundo das técnicas e dos
saberes que envolvem um arquivo, metodicamente executava seu trabalho. Um dia
teve uma ideia. Comprou para si uma coleção de revistas que abarcava todo o
século 20 e a partir daí começou a dizer que iria instituir um arquivo. Dez
anos depois finalizou a empreitada: Arquivo dos Sonhos. Abriu pra comunidade.
Nos primeiros meses, poucas consultas e visitações. De repente um burburinho
começou a percorrer a cidade. Há alguma coisa no arquivo do arquivista, diziam;
por que ele fez aquilo, questionavam. Um dia, então, fui ao Arquivo. Certo de
encontrar um arquivo como qualquer outro: eu estava certo e errado ao mesmo
tempo; nem tento explicar... O fato é que o arquivista tinha mutilado a
estilete todas as revistas, extirpando delas toda notícia, comentário ou imagem
que não refletisse o amor. Nos espaços vazios colou cuidadosamente um papel
estampado com flores bem pequenas e cores bem vivas, que escolhera para esse
fim.
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